N.108 | 2 de Setembro de 2014
Nova seção no Alerta
DIÁLOGOS POSSÍVEIS
Em busca do diálogo entre as Ciências
A seção Diálogos se destina a fomentar a interação entre pesquisadores/autores, de distintas áreas do conhecimento, que disponibilizam o conteúdo de sua produção no Repositório Institucional da UFBA. Boa leitura!
Alerta é uma publicação do Núcleo de Disseminação do Conhecimento (NDC) e destina-se a divulgar a produção acadêmica da UFBA registrada no seu Repositório Institucional. O Núcleo foi criado e é mantido pelo Grupo Gestor do Repositório Institucional da Universidade Federal da Bahia (RI/UFBA). Para mais informações e para acessar todas as edições do Alerta, visite: www.ndc.ufba.br.
A professora Vanessa Hatje (VH) do Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia (UFBA) dialoga com o professor Daniel Tourinho Peres (DP)da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA.
(VH) Seus estudos durante o mestrado, o doutorado e também como pesquisador consolidado na UFBA concentraram-se em diferentes aspectos sobre a filosofia, política e lógica desenvolvidos por Kant. Por que este filósofo foi o objeto de estudo escolhido por você? O que faz o trabalho de Kant ser tão especial?
(DP) A decisão de começar a trabalhar a filosofia de Kant foi acidental, quer dizer, poderia ter sido um outro filósofo. A ideia era estudar um filósofo que fosse formador, ou seja, que transitasse em todos os domínios importantes da filosofia. Platão, Aristóteles, Tomás, Spinoza, Leibniz, e tantos outros, são todos filósofos formadores. Agora, o incrível é ter ficado tanto tempo em Kant, pois já se vão quase 20 anos. Aliás, quem me propôs ler Kant foi João Carlos, nosso atual reitor. Eu continuei; ele não foi nem ao segundo Seminário!Quando comecei a ler Kant, ocorreram mudanças importantes no mundo: final da Guerra Fria, queda do muro de Berlim. Esses eventos políticos tiveram um impacto importante do reordenamento do “mundo das ideias”, ao mesmo tempo em que sofre também o seu impacto. Com tais fenômenos e a concomitante saída de cena do marxismo, Kant se tornou um pensador “natural” para continuar refletindo sobre as questões políticas, como democracia, justiça, igualdade e liberdade. Pois ele representa uma reafirmação do projeto moderno, mas sem o peso do determinismo ou da objetividade hegeliano-marxista. Então, essa escolha, que foi acidental, acabou como que seguindo uma tendência geral.
Mas a verdade é que existem várias maneiras de ler um filósofo, Kant em particular. Meu interesse está em um Kant aporético, isto é, que avança uma série de questões e problemas, mas que guarda um certo ceticismo quanto a ter conseguido apresentar a última resposta para todos eles. Essa é uma maneira de ler que põe a política como central para uma compreensão da racionalidade humana, ou seja, é na política, no juízo política que melhor se expressaria a razão. Mas isso implica em reconhecer que a razão lida com o contingente, com o particular; implica em reconhecer que nossos juízos, mesmo que comportem uma pretensão de universalidade e necessidade, são provisórios, isto é, devem ser revistos. Muito kantiano ortodoxo torceria o nariz para isso. Mas e daí? Entre o conforto do absoluto e abertura do contingente, fico com a abertura do contingente.
(VH) O desenvolvimento da pesquisa em áreas de ciências dura, comparado com as ciências humanas, inclusive a filosofia, faz uso de premissas, métodos e ferramentas bastante diversos. Parece-me que os pesquisadores de ciências duras, muitas vezes carecem de uma formação adequada em filosofia da ciência. Esta teria sido desejável e, potencialmente, possibilitaria a partir de competências e habilidades dos pesquisadores o desenvolvimento de um processo de reflexão diferenciado. Como você vislumbraria a possibilidade de uma maior aproximação entre as ciências humanas e duras?
(DP) Se a gente prestar um pouco de atenção verá que essa distinção entre ciência “dura” e ciências humanas é bem recente. Data do século XIX, a partir da distinção entre ciências da natureza e ciências do espírito. Antes você já tem alguma coisa em termos de distinção, por exemplo, entre conhecimento histórico e conhecimento racional, mas é no XIX que as humanidades se afirmam como um domínio próprio. Assim, durante muito tempo o que prevaleceu foi uma ideia única de ciência, com procedimentos também únicos. Não atoa, durante muito tempo a matemática teve um lugar privilegiado entre as ciências, uma vez que nela se realizava da forma mas perfeita o método de um conhecimento rigoroso. A pretensão de Descartes, por exemplo, de resto compartilhada por toda racionalismo clássico, era fazer filosofia do modo geométrico, isto é, segundo uma ordem de razões. Com a crítica ao racionalismo, a experiência, o papel da experiência no conhecimento acaba por ter o seu lugar reconhecido, mas nunca da mesma forma e com o mesmo pelo que a matemática, a lógico-matemática o fora. Nesse particular, a biologia e a química talvez tenham sido dos últimos campos do conhecimento a adquirirem o estatuto de ciência, justamente pela dificuldade em aplicar a matemática aos seus objetos.
Acho que um diálogo maior entre filosofia e as ciências seria muito benéfico para todos. Veja que no Brasil, a filosofia fica de modo inequívoco no campo das humanidades. Mas não é assim em todos os lugares. Há toda uma tradição da filosofia que trabalha muito próximo das ciências “duras”, da física e da matemática, sobretudo. Agora, é preciso muito cuidado nessas aproximações, porque os objetos são muito distintos, especialmente no que diz respeito aos objetos das ciências duras e das ciências humanas. Não é a mesma coisa eu analisar movimentos dos astros e movimentos sociais, de modo que é bom sabermos o que cada um faz, como faz e porque faz, mas não devemos achar que há uma única forma de fazer ciência, que há um único modo de analisarmos a realidade. Até porque, do meu ponto de vista, um dos ganhos da modernidade está na distinção entre natureza e cultura, e não gostaria de ver isso perdido.
Particularmente, eu tenho um muito maior interesse numa aproximação da filosofia com a arte do que com as ciências. E isso por razões que não são apenas domésticas. Acho que a arte acaba por apresentar uma maneira de pensar a diferença muito mais aberta e muito mais rica de possibilidades do que as ciências. Atualmente há todo um esforço em aproximar filosofia e ciência, sobretudo no campo da psicologia e da neurociência que eu acho lamentável.
(VH) Existe uma ampla discussão sobre a implantação da filosofia no ensino médio e fundamental. Certamente os alunos iriam se beneficiar com a leitura, análise crítica e discussão de textos clássicos de filosofia. No entanto, os manuscritos e livros de filosofia não são exatamente textos didáticos. Como você enxerga o potencial sucesso da implantação da filosofia na rede pública e mesmo privada visto a dura realidade do ensino no Brasil. Temos condição de suceder e ter ganhos reais nesta tarefa?
(DP) Sou muito cético quanto a isso. Não apenas com relação ao ensino de filosofia, mas com o ensino em geral em nosso país. Acho que estamos perdendo um tempo enorme, e esse tempo não temos como recuperar, porque as gerações simplesmente sucedem umas às outras. Eu realmente não sei o que fazem as escolas de educação. Mas a culpa, claro, não é apenas delas. Pode dizer que é chavão, mas o professor tem de ser
valorizado, e isso passa por melhores salários. Não há bom professor, quando se tem de ficar mais de 40 horas em sala de aula para poder sobreviver com dignidade. Então, chega a ser absurdo cobrar do professor.
Mas o fato é que eu vejo uma dificuldade muito grande na formação dos professores, especialmente se levarmos em consideração o que está disponível para os alunos em termos de acesso à informação – e claro que reconheço que há enormes diferenças quanto a essa disponibilidade entre as diferentes camadas da sociedade. São poucos os professores que conhecem o que ensinam para além do livro didático. E se não conhecem, não podem tornar o objeto interessante. Acho que a escola carece enormemente de imaginação. Mas para a imaginação funcionar bem, é preciso ir além do livro didático. Eu disse ir além. Porque o que pode estar acontecendo é um ficar aquém.
Quanto à filosofia propriamente dita, acho que ela poderia justamente contribuir para tornar o ensino mais imaginativo e investigativo. Mas para isso ela deveria estar muito próxima das outras disciplinas. Seria legal, por exemplo, quando se apresentasse uma questão de matemática, se apresentasse, ao mesmo tempo, a sua variante filosófica. É preciso despertar a curiosidade, isso é o melhor que a escola pode fazer. A filosofia pode ajudar nisso? Pode. Vai? Não sei, no geral acho que não.
ACERVO
CAATINGA
O termo tem origem indígena e significa “mata clara e aberta”. A Caatinga é um bioma localizado na região do semi-árido nordestino e apresenta riqueza natural em termos de biodiversidade e fenômenos característicos. Essa biodiversidade ampara diversas atividades econômicas, entretanto, a exploração de forma ilegal e insustentável tem contribuído para o desgaste da região. Com vistas à conservação, o governo tem criados medidas para promover o uso sustentável da região. No RI/UFBA você encontra diversos trabalhos acadêmicos sobre este tema, entre os quais:
Estratégia alimentar para produção de caprinos no semiárido pernambucano
Medeiros, Thaiany Araújo Ferreira
Externalidades econômicas e ambientais da exploração da Caatinga na microrregião de Serrinha – BA
Organização das comunidades locais de Apoidea em uma área de caatinga, Canudos-Ba.
AMPHIBIAN CONSERVATION IN THE CAATINGA BIOME AND SEMIARID REGION OF BRAZIL
ASMA
É uma doença inflamatória crônica das vias aéreas. Quando essas vias são expostas a vários estímulos ou fatores desencadeantes, tornam-se hiper-reativas e obstruídas, limitando o fluxo de ar através de broncoconstrição, produção de muco e aumento da inflamação. A asma pode ser difícil de diagnosticar. Alguns dos sintomas de asma, como a dipneia aguda, o aperto torácico e a pieira (ruído pulmonar), podem ser provocados por outras doenças. Entre os fatores mais comuns da desencadeação da asma, estão os alergênios (ácaros domésticos, baratas, pólen, pelos de animais e fungos) e diversos fatores ambientais, como o fumo de tabaco – ativo e passivo –, a poluição do ar, irritantes químicos, exercício físico e alguns fármacos, como a aspirina. No RI/UFBA você encontra diversos trabalhos acadêmicos sobre este tema, entre os quais:
Associação entre Asma de Difícil Controle e doença do refluxo gastroesofágico
Investigação sobre fatores de risco para atopia e asma em escolares de São Francisco do Conde, Bahia
A percepção do controle dos sintomas em pacientes asmáticos
Características clínicas e prognóstico em pacientes com asma quase fatal em Salvador, Bahia
Modernização, urbanização e asma: um estudo em transição do norte do Equador
BIORREMEDIAÇÃO
Processo pelo qual organismos vivos são utilizados para remediar contaminações no ambiente. Utilizando processos biodegradáveis para tratamento de resíduos, este processo é capaz de regenerar o equilíbrio do ecossistema original. Por ser um processo natural, a biorremediação promove um tratamento adequado com custo relativamente baixo. Contaminações das águas, do solo, derramamento de petróleo no mar, entre outros, são passíveis de terem suas consequências minimizadas utilizando a técnica da biorremediação. Nem todos contaminantes são tratados facilmente por essa técnica, por exemplo, metais pesados, como o cádmio e o chumbo, não são absorvidos pelos microorganismos. No RI/UFBA você encontra diversos trabalhos acadêmicos sobre este tema, entre os quais:
Utilização dos fungos na biorremediação de substratos contaminados por petróleo: estado da arte
Oliveira, Olívia Maria Cordeiro de
Processos de biorremediação em áreas influenciadas por atividades petrolíferas
Alerta circula semanalmente, às terças-feiras, sob a coordenação de Flavia Garcia Rosa (Edufba) e Rodrigo Meirelles (RI/PROPCI). A execução está a cargo de Bernardo Machado, Évila Santana Mota (estagiários do Repositório Institucional). A revisão é de Tainá Amado (estagiária do Repositório Institucional). O design gráfico é de Gabriela Nascimento e Laryne Nascimento (Edufba). A divulgação está a cargo de Camila Fiuza (estagiária da Edufba).